quinta-feira, 28 de junho de 2012

Evocando Dorian Jorge Freire




Como bom mossoroense, vibrava lendo-lhe os textos de “Dia de Domingo”, artigo semanal produzido para a Tribuna do Norte

Tarcísio Gurgel
Escritor
Especial para o Clandestino

Haver conseguido de Dorian Jorge Freire autorização para selecionar artigos/crônicas dos incontáveis por ele produzidos, e enfeixá-los no livro a que, com sua aprovação, dei o título de Os Dias de Domingo foi, para mim, uma experiência das mais ricas e excitantes. Não é difícil entender: a princípio ele relutou em aceitar (o inevitável ceticismo quanto à competência de quem estava se lançando à empresa?) e eu sabia, naturalmente, que corria riscos. Mas estava absolutamente confiante de que o resultado final haveria de agradar a todos. Até a ele mesmo.

Devo dizer que nunca fiz parte do seu círculo de amigos mais próximos. Mas, juntamente com Jaime Hipólito Dantas, ele se tornara referência de talento para os da minha geração. E essa admiração respeitosa, não seria abalada sequer com os breves e irreverentes comentários de ambos quando da primeira encenação do espetáculo que, reescrito, se chamaria “Chuva de Bala no País de Mossoró”, ainda nos anos setenta. 

Como bom mossoroense, vibrava lendo-lhe os textos de “Dia de Domingo”, artigo semanal produzido para a Tribuna do Norte, e com a unânime admiração dos colegas natalenses. E, ante a constatação de que a sua notável produção corria o risco de ficar esquecida se não adquirisse a forma de livro – argumento que por certo pesou no processo de convencimento – lancei mão de uma amiga comum para os primeiros contatos: Maria Emília Wanderley. Maria Emília, de Berilo de Maria Emília. Sabia que era recurso infalível e usei-o descaradamente. E tive acesso a um rico material. E trabalhei sem qualquer interferência do autor, agora já confiante e, estou certo, lutando para não demonstrar qualquer tipo de vaidade. 

Hoje em dia já não se dá tanta importância a isto de estilo. Vivemos um tempo em que uma imensa quantidade de textos de não-escritores inunda a academia. Elaborados no mais das vezes após apressada assimilação de certos pressupostos teóricos e regras bibliográficas sem revelar, necessariamente, talento, tais textos promovem uma inevitável, monótona estandardização. E se oferecem – quase sempre – como uma colcha de retalhos de juízos fragmentários sob o zeloso – e quase sempre pouco criativo – olhar do orientador.

Tempo houve em que, a depender do talento de quem escrevia era possível imaginar-se a quantidade e a qualidade de livros lidos. Era o tempo de Dorian Jorge Freire. Por isso, ao trabalhar seus textos com meus alunos em sala de aula, fazia questão de trazer à discussão temas como inspiração e transitoriedade do texto jornalístico. O escritor Dorian independia da primeira e desmoralizava o sentido da segunda. E por quê? Obviamente porque aliava ao indiscutível talento para as letras, de que era possuidor, a um acervo de leituras que só uns poucos conseguiram atingir no Rio Grande do Norte.

Esse registro de que me orgulho não ficaria completo se não mencionasse também o entusiasmo do apoiador do projeto de edição de Os Dias de Domingo, o então livreiro/Reitor Gonzaga Chimbinho. E a capa de Marcelo Mariz. E a gostosa ilustração de Emanuel Amaral, ele, cigarro na mão – sentando sobre uma pilha de livros – a dedilhar freneticamente a sua máquina de escrever. Como não posso esquecer também que o livro (que viria a ser reeditado pela Coleção Mossoroense) praticamente se esgotou nos lançamentos de Natal (os jardins do Teatro Alberto Maranhão pequenos para tantos amigos e admiradores) e Mossoró. Não tendo participado desse último, curti no teatro tão querido a glória do mossoroense. E ri intimamente ao evocar a sucinta dedicatória que ele fizera num daqueles primeiros exemplares já confeccionados que fui levar até sua casa. Sem grandes expansões, quase graciliânico, ele pespegara no exemplar, hoje em poder de algum sócio meu – em lugar incerto e não sabido – a única dedicatória possível para o seu semiárido querer bem: “O culpado é você”.

Texto publicado na edição 18 do jornal CLANDESTINO.

Foto: Raul Pereira




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